sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Identidade

- Ai, odeio esse lugar apertado. Sou uma modelo famosa, sabia? Não deveria me juntar a pessoazinhas comuns como vocês.
- Pois eu gosto. Aliás, acho muito aconchegante, se não fosse por vocês 4. Tenho de ficar limpando tudo sozinha, arrumando tudo sozinha. Não se cansam dessa bagunça não?
- Quer que eu acabe com a bagunça para você, sua magricela reclamona. Basta me desamarrarem desta cadeira que eu faço um serviço tão limpo e perfeito, como o que fizemos com aquele cara na semana passada.
- Eu também acho esse lugar beeeeemmm aconchegante. Aliás, é até muito sexy, sabiam? Huumm, olha só essa escrivaninha branca, essa cama macia. Dá uma vontade de deitar nela e não sair mais. Vocês entenderam, né?
- Por que fizemos aquilo? Me digam, porquê? Ele era um cara tão bom. Era pai, sabia? Assim como todos os outros. E foram tantos. Por que sempre fazemos isso? A perseguição, a tortura, a dor, a morte... As cenas se repetem de novo, e de novo e de novo... Se eles não nos tivessem trancafiado aqui, nada disso acabaria.

A porta se abre. Uma moça jovem, de uniforme branco, entra. Ela não demonstra medo. Tenta, pelo menos, pois seus olhos a traem. Atraem. Traz consigo, uma bandeja. Nela, há dois copos. Com uma voz firme, ela diz: “Tome o seu remédio, Sr. Roberto”. Pega a bandeja e sai apressada daquele horrível quarto no hospício.

O gosto é amargo. Ele nem sente. Seu olhar, vidrado, acompanha cada passo da jovem enfermeira que acaba de ir embora. “Ah, se tivéssemos apenas um momento a sós com ela....”.